Thursday, December 04, 2008

Urso amestrado


As minhas palavras sobem ao vento fustigado do norte. A terra chama por mim, sem demora, tenho de ir, rever os sítios dos quais me começo a esquecer de todos os pormenores que por tanto tempo orgulhosamente observei e decorei.
A queda da cidadela à muito aconteceu mas visito as suas ruínas revestidas de musgo variadas vezes. Ecos negros andam no local, troçando de mim, como uma segunda voz, uma distante mas audível. A luz ténue do sol flutua sobre o local, lembrando me de um cavaleiro e de sua lança, belo e orgulhoso, hoje apenas lendário.

Desaparecem as imagens dos meus olhos chorosos na distância de um passo teu. Por vezes és intangível. Por vezes sou tão morto que engano todos, pensando que não existo mesmo, que a morte me chegou ao destino final. Sou um negrume no mundo, sem talento, sem dádiva divina, sem um rumo que me diga o que fazer. Sou livre preso dentro de uma jaula de cristal, sozinho e cheio de olhares do mundo, expectante qual o próximo passo deste urso amestrado. A cor do meu pelo vai se perdendo de um castanho belo para um cinzento fantasmagórico. A tristeza vai me transformando no que sempre fui desde início, um urso de barro, daqueles de enfeitar, apenas enfeitiçado à muito por uma ligação que vida que nunca durará para sempre.

Acalmo as ondas com a tristeza que de mim advém. O mar nem sequer pergunta o porque das lágrimas secas no meu rosto, ele sabe bem as razoes e nem sequer questiona. Apenas não esvoaça tanto por ai com sua espuma branca sedosa, com respeito a minha existência.
Colosso negro, cavaleiro da lança, mestre dos jogos, escritor amargurado… seja aquilo que for, são tudo camadas. Este texto é a ultima camada.

Aproveitem o espectáculo deste urso amestrado, é realmente divertido.

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